Estudo Bíblico Bem-aventuranças - O Evangelho do Reino


1. Introdução

George Bernard Shaw, certa vez, descreveu o Sermão da Montanha como "uma explosão impraticável de anarquismo e de sentimentalismo". O filósofo alemão Friedrich Nietzsche tratou-o ainda menos benignamente, quando escreveu que "a moralidade cristã é a mais maligna forma de toda a falsidade" (Ecce Homo). Em 1929, o humanista John Herman Randall estava disposto a reconhecer que Jesus era "verdadeiramente um grande gênio moral" mas ao mesmo tempo estranhava como um carpinteiro galileu pudesse ter enunciado a última palavra em ética humana (A Religião no Mundo Moderno). Porém, muitas outras pessoas têm apreciado este sermão com grande reverência, até mesmo quando não o conheceram nem o entenderam muito bem. Pode-se dizer, com segurança, que o Sermão da Montanha é o mais conhecido, menos entendido e menos praticado de todos os ensinamentos de Jesus.

A mente moderna, tanto religiosa como irreligiosa, tem tratado este sermão das maneiras mais variadas. Como antes notado, alguns o rejeitaram como totalmente impraticável ou positivamente mau. Outros o aceitaram, mas com reservas significativas. O humanismo, na sua forma mais benevolente, viu-o como um código moral notável, mas experimental, totalmente separado da cruz ou de um Cristo divino. O liberalismo religioso o vê mais como um projeto para reconstrução social do que para conversão pessoal. Albert Schweitzer o explicava como uma ética especial, para uma época especial, baseada na crença equivocada de Jesus de que o fim de todos os tempos estava para acontecer.

Entre os conservadores religiosos, muitos pré-milenaristas o vêem como mais uma "lei", inconsistente com uma era de graça, e de aplicação impossível num mundo pecaminoso. Eles esperam o seu cumprimento em um "reino milenial". A grande parte do protestantismo evangélico tem separado a vida em duas arenas, uma pessoal, e outra social. Para eles, a ética do Sermão da Montanha é destinada a conduzir somente os relacionamentos pessoais. Eles consideram impossível aplicar os preceitos deste sermão aos negócios e ao governo.

Tudo isto é para dizer que temos operado uma maravilha em nossos tempos ao tomarmos o documento mais revolucionário da História e transformá-lo em algo manso e inconseqüente. A palavra de Deus tem sido severamente embotada. O evangelho tem sido aparado para ajustar-se ao estilo de vida dos homens indisciplinados e indulgentes.

Há um sentido verdadeiro em que temos retornado ao ponto de partida. O Sermão da Montanha foi primeiro dirigido a um mundo no qual os fariseus tinham conseguido drenar a vida e o significado da lei de Moisés. Vivemos num mundo que transformou o evangelho em pouco mais do que civilidade do século vinte. Por esta razão, é da maior urgência que olhemos freqüente e cuidadosamente para o sermão do Filho de Deus que, talvez, mais do que qualquer outro, define a própria essência do reino do céu. Aqui, se ouvirmos humildemente, nossas vidas poderão ser transformadas, nossos espíritos revigorados e nossas almas salvas.

"O Evangelho do Reino"

O ponto de vista do Novo Testamento sobre o sermão é melhor entendido na introdução que lhe fez Mateus. O Sermão da Montanha é "o evangelho do reino" (Mateus 4:23). Isto deveria servir para esclarecer duas coisas: Primeiro, que ele não é meramente a exposição da lei e, segundo, que suas bênçãos e princípios éticos não são atingíveis pelos não convertidos. Este é um sermão para os cidadãos do reino. A salvação, e não a reconstrução social, é seu alvo e os homens de sabedoria mundana estão destinados a jamais entendê-lo.

O relato de Lucas (Lucas 6:12-49) coloca o sermão no segundo ano da pregação pública do Senhor, no auge de sua popularidade, uma popularidade em que ele nunca confiou (João 2:23-25) e que se verificou ser de pouca duração (João 6:66). Aqueles tempos parecem ter sido caracterizados por um grande entusiasmo religioso, que era tanto desorientado como superficial.

O Sermão da Montanha permanece como uma explanação da verdadeira natureza do reino de Deus. É um sermão proferido na História e serve para responder às questões que, naturalmente, seriam levantadas pelo anúncio em Israel do iminente aparecimento do reino (Mateus 3:1; 4:17). Mais ainda, o caráter totalmente inesperado do pregador e o acirrado conflito entre Jesus e os fariseus estavam para provocar ainda maior preocupação entre aqueles que primeiro ouviram o grito: "Está próximo o reino dos céus!"

O discurso de Jesus na encosta de um monte galileu não é, na realidade, um mero sermão. Ele mais se aproxima de um manifesto do reino de Deus. Há mais ensinamento de Jesus do que este, mas aqui sentimos a verdadeira essência da verdade do reino; e o negligenciaremos com nosso próprio risco. Porque ele trata de atitudes, o sermão permanece na entrada do reino de Deus tanto quanto em seus mais exaltados planos. Ele não é somente carne para os maduros mas um desafio àquele que faz sua primeira aproximação ao domínio e à justiça do céu.

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