Aliança e Sacerdócio

Hebreus 4:14 - 10:23


A Epístola aos Hebreus admite a priori que seus leitores entendem comunhão com Deus em termos de mediação sacerdotal. Não explica a necessidade dessa mediação. Mas em 12:18-29 faz-se o contraste entre Deus no Sinai, e a proximidade atual de Deus pela medição sacerdotal de Jesus Cristo.

O ser humano não tem condições de sobreviver à presença imediata de Deus: "pediram que se lhes não falasse mais" (12:19b), "porque não podiam suportar o que se mandava: se até um animal tocar o monte, será apedrejado" (12:20); o próprio Moisés ficou "todo assombrado e tremendo" (12:21). O povo "que não trespasse o termo para ver o Senhor, a fim de muitos deles não perecerem" (Ex. 20:21).

Sem a cortina protetora de um mediador, provavelmente o homem se desintegraria na presença de Deus: "o nosso Deus é um fogo consumidor" (12: 29). Mesmo a Lei foi posta pelos anjos na mão de Moisés. (Gal. 3: 19).

Deus não mudou. Mas agora os cristãos se encontram perante "Jesus, o mediador de uma nova Aliança" (12:24a), e por isso, chegam até "Deus, o juiz de todos" (12: 23b). Entre nós e o Juiz, encontra-se Jesus Cristo.

Não existe aliança entre Deus e os homens sem mediador; um sacerdote é indispensável, pois sem sua mediação não teremos comunhão com Deus.

Na Aliança do Sinai estabeleceu-se o sacerdócio aarônico símbolo e sombra da mediação perfeita. A mediação aarônica era apenas "cópia e sombra das coisas futuras" (8:5a), "alegoria para o tempo presente em que se oferecem dons e sacrifícios que, quanto à consciência, não podem aperfeiçoar aquele que faz o serviço" (9: 9).

Mas, mesmo no Sinai; mesmo para Abraão; mesmo para o começo dos séculos, a comunhão do homem com Deus foi possível pela mediação do Filho de Deus, além e acima do sacerdócio alegórico, "doutra maneira necessário lhe fora padecer muitas vezes desde a fundação do mundo; mas agora na consumação dos séculos uma vez se manifes-tou para aniquilar o pecado pelo sacrifício de si mesmo" (9: 24 - 26).

Embora o sacrifício de Cristo seja historicamente datado, e um só, contudo seu sacerdócio vem do começo dos séculos e não terá fim. É o sacerdócio eterno do Filho que convalida o serviço levítico. E é ele que legitima Melquisedeque.

É sempre Cristo o Mediador, de sempre para sempre; seu aparecimento na história tem sentido cósmico: é a revelação, em tempo e lugar estabelecidos, de uma mediação anteriormente viva e eficaz, mas não explícita. De outra sorte, necessário lhe fora padecer muitas vezes, desde a fundação do mundo; mas o Mediador é ele, foi Ele, desde a Fundação do mundo. Com Ele, de sempre e para sempre, a aliança de Deus, ratificada "pelo sangue da Aliança eterna" (13: 20a).

Mas quando o mediador se manifestou a história se tornou climáxica (uso essa forma deliberadamente), chegara "a consumação dos séculos" (9: 26b). O que faz pensar em história como o desenvolvimento no tempo das relações de Deus com o homem.

Foi o Filho quem deu sentido e validade ao sacerdócio aarônico do qual ainda havia, ao escrever-se a epístola, "sacerdotes que oferecem dons segundo a lei, os quais servem de cópia e sombra das coisas celestiais" (8: 4c, 5a); o primeiro tabernáculo "é uma alegoria para o tempo presente" (9: 9a).

Mas, se sacrifícios e Tabernáculo eram alegoria e sombra, "Cristo não entrou num santuário feito por mãos, figura do verdadeiro, porém no mesmo céu, para agora comparecer por nós perante a face de Deus" (9: 24).

Essa comunhão não era a comunhão final, mas era significativa, pois sombra, cópia, símbolo, do culto atual mediante Jesus Cristo. Também o sacerdócio de Melquesé-deque toma significado do Cristo eterno: Melquisedeque é "feito semelhante ao Filho de Deus" (7: 3b).

Seu sacerdócio permanece (em Cristo e com Cristo); diversamente do sacerdócio levítico, Cristo, "porque permanece eternamente, tem um sacerdócio perpétuo" (7:24). Ele é que foi feito sacerdote eterno segundo a ordem de Melquisedeque, pois entrou por nós até ao interior do véu, "feito eternamente sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque" (6: 20).

Ele, o depositário do juramento divino do Salmo 110, "Tu és um sacerdote eterno, segundo a ordem de Melquisedeque"; é, portanto, ele "aquele de quem se testifica que vive" (7: 8), e que, por Melquisedeque, recebeu os dízimos de Abraão. E agora vive sempre para interceder por aqueles que, por sua mediação, se chegam a Deus, pois "pode salvar perfeitamente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles" (7: 25).

Autor: Boanerges Ribeiro