Tradição Oral e Escrita

 
Um leitor pediu minha manifestação a respeito de um texto extraído do Livro Diálogo Ecumênico (Temas Controvertidos), de Dom Estêvão Bettencourt, osb, Ed. Lumen Christi. Parte do texto:
 
“Ora, sabe-se que a revelação de Deus aos Patriarcas, aos Profetas e aos Apóstolos se realizou sem o concurso da escrita: os antigos só rara e dificilmente escreviam, pois tal arte era árdua e dispendiosa; as mensagens eram transmitidas por via meramente oral. Detendo-nos, de modo especial, na revelação do Novo Testamento, verificamos que Jesus Cristo nada deixou escrito nem se preocupou com a redação de seus ensinamentos. Apenas mandou aos Apóstolos [para que] fossem pregar pelo mundo e se tornassem testemunhas da verdade (cf. Mt 10,7; 28,18-20; Mc 16,15). Texto extraído do Livro Diálogo Ecumênico (Temas Controvertidos), de Dom Estêvão Bettencourt, osb, Ed. Lumen Christi”.
 
Resposta:
Chamou-me a atenção o último tópico em que o articulista diz que Jesus não se preocupou em escrever ou mandar escrever seu Evangelho.
 
Jesus não teve mesmo preocupação de a cada dia escrever seus ensinos e milagres. Deixou essa tarefa para seus discípulos. Ele sabia que depois de cumprida Sua missão, tudo seria escrito, sem que houvesse perigo de omissões, contradições ou erros. Leiam:
 
“Mas aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as coisas, e vos fará lembrar de tudo quanto vos tenho dito” (Jo 14.26).
 
A afirmação de que não houvera preocupação da parte de Jesus revela, de forma velada, a intenção de valorizar a tradição oral naquilo em que não está escrito na Bíblia. Após a ascensão de Jesus e até serem escritos os evangelhos, os discípulos guardaram na memória os ensinamentos do Senhor. Depois, inspirados e guiados pelo mesmo Espírito, colocaram tudo no papel. Leiam:
 
“Toda a Escritura é divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redargüir, para corrigir, para instruir em justiça. Para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente instruído para toda a boa obra” (2 Tm 3.16-17). Em verdade, Jesus, quando estava entre os apóstolos, não recomendou que tudo fosse escrito. Mas, se houve inspiração divina na escrita dos Evangelhos, logo o Senhor Jesus sempre esteve atento à necessidade de deixar o Novo Testamento devidamente registrado.
 
Seria muito difícil se os oráculos de Deus não tivessem sido registrados num livro, à disposição de todos, para livre leitura. A palavra final ficaria a cargo dos pregadores, cada qual apresentando uma história diferente. Se com a palavra escrita ainda surgem muitas deturpações, o que não seria se tivéssemos apenas a tradição oral? Ficaria difícil “manejar bem a palavra da verdade” (2 Tm 2.15).
 
“Sabendo primeiramente isto: que nenhuma profecia da Escritura é de particular interpretação. Porque a profecia nunca foi produzida por vontade de homem algum, mas os homens santos de Deus falaram [e escreveram] inspirados pelo Espírito Santo” (2 Pe 1.20-21). As profecias não se originaram das idéias, ou raciocínio de seus escritores, mas do Espírito. Com certeza, antes das Escrituras prevaleceu a tradição oral, o ensino face a face. Esse tipo de ensino continua, mas sempre terá como base de verdade a Bíblia Sagrada. Lembremo-nos de que a Escritura é proveitosa para ensinar (2 Tm 3.16-17). O ensino proveitoso, eficaz e verdadeiro provém da Bíblia Sagrada.
 
O Senhor Jesus sempre valorizou a Escritura. Disse Ele: “Errais, não conhecendo as Escrituras, nem o poder de Deus” (Mt 22.29); “Ainda não lestes esta Escritura: A pedra, que os edificadores rejeitaram, Esta foi posta por cabeça de esquina” (Mc 12.10). “Então começou a dizer-lhes: Hoje se cumpriu esta Escritura em vossos ouvidos” (Lc 4.21); “Examinais as Escrituras, porque vós cuidais ter nelas a vida eterna, e são elas que de mim testificam” (Jo 5.39).
 
Naquela oportunidade, Jesus não poderia ter recomendado a leitura dos Evangelhos, a serem escritos posteriormente. Hoje podemos dizer que, para não andarmos errantes, o ensino de Cristo é o padrão por excelência, nossa regra de fé e prática, e, por extensão, toda a Bíblia.
 
O Senhor Jesus, o Deus encarnado, teve o cuidado de mandar escrever toda a visão concedida a João:
 
“E o que vivo e fui morto, mas eis aqui estou vivo para todo o sempre. Amém. E tenho as chaves da morte e do inferno. Escreve as coisas que tens visto, e as que são, e as que depois destas hão de acontecer” (Ap 1.18-19; cf. 14.13; 21.5). Três vezes, no Apocalipse, Ele recomenda: “ESCREVE”. Qual seria a versão válida do Apocalipse e dos Evangelhos não tivéssemos a palavra escrita? Os bereanos se valeram das Escrituras para terem certeza de que Paulo e Silas estavam corretos em suas palavras (At 17.11). Conclui-se, que Paulo e Silas só ensinaram aquilo que estava conforme a palavra escrita. Hoje, a Igreja faz o mesmo: somente o que está escrito.
 
Autor: Pr. Airton Evangelista da Costa